Quando entrei para a graduação de História da Arte na UFRJ, um dos primeiros trabalhos que fiz foi o de História das Artes Visuais 1, com mais duas queridas amigas – Isabella Assumpção e Alexandra Marinho.
Foi um trabalho muito interessante que fizemos sobre a vestimenta na Grécia Antiga. Descobrimos muitas coisas inclusive a questão hierárquica visualizada pelas vestimentas e acessórios. Abaixo publico o trabalho original. Espero que gostem!

A indumentária é fenômeno que nos concede informações históricas, econômicas, etnológicas e tecnológicas de uma de cultura e um tempo. Segundo Daniela Calanca é “[…] um sistema de signos por meio do qual os seres humanos delineiam a sua posição no mundo e a sua relação com ele. ” Declarada a sua importância essa forma de linguagem pode ser usada como expoente para entendermos a dinâmica das relações socioculturais de civilizações como minoico, micênica e grega. Assim como todos os demais aspectos da vida da pólis, estabelece relações sociais e econômicas tanto entre seus cidadãos quanto entre os demais povos de maneira sutil, quase imperceptível, embora esteja à mostra para todos. A premissa básica da teoria da indumentária é que sua função primária é a associação de significados não-verbais ou signos. Os componentes essenciais da indumentária incluem a vestimenta, as jóias, estilos de cabelos, acessórios, pintura corporal e piercings.
Na Grécia, a literatura assim como o teatro a menção de detalhes da vestimenta dos personagens tem o papel de projetar no imaginário a posição social ou evidenciar um comportamento. Aspectos relevantes como exemplos cabelos e barbas eram inspirados em heróis, heroínas e deuses das narrativas mitológicas, leva-se em consideração a influência assíria que tinha por costume cabelos e barbas abundantes. Esses dois elementos da indumentária criavam uma identificação entre os gregos já que os bárbaros tinham cabelos curtos e despenteados. O caráter estético das vestimentas como símbolo de sensualidade era muito prezado, porém a nudez não era algo vergonhoso.
O Mito de Philomela e o Mito de Arachne fazem menção a produção têxtil como uma atividade feminina, desde a fiação até a tecelagem. Dentro dessa esfera as mulheres mas abastardas produziam bordados, feitos nas extremidades dos tecidos, para se comunicar e apenas aquelas que pertenciam a essa classe (tecelãs) poderiam decodifica-los. Os aromas também eram valorizados devido a crença de que seriam um presente dos deuses do Olimpo, era costume perfumar os cabelos e as roupas de reserva por meio de um óleo aromático.
Período Pré-helênico – Minóicos

Neste período estaremos contemplando as civilizações minóica e micênica, apontando suas diferenças básicas. As mulheres são retratadas com vários adornos entrepostos, roupas ricas em detalhes e cores e com penteados elaborados. A joalheria minoica tem como características principais o uso do conhecimento tecnológico de fundição em metal e uma ingenuidade no design, além de alegria na representação vibrante da Natureza e uma dedicação à leveza, à expressividade e às formas. Inicialmente foram influenciados técnica e artisticamente pelos egípcios e pelos babilônicos, os minóicos desenvolveram uma característica única na joalheria baseada na fundição de metais preciosos. Os materiais utilizados incluem ouro prata e bronze, e dentre as pedras preciosas destaca-se os cristais de rocha, a cornalina, o lápis-lazúli, a granada, obsidiana e o jasper vermelho, verde e amarelo. O ouro era importado, denotando um alto status econômico aos usuários.
O ouro foi manipulado de muitas formas: batido, gravado, moldado e perfurado, às vezes com matrizes de estampas. Outras técnicas incluíam filigrana, marchetaria, cobertura de folha de ouro e, finalmente, granulação. Dentre os tipos de jóias, o mais comum era o anel. Na joalheria minóica este era utilizado mais do ponto de vista estético do que hierárquico. Um exemplo é o anel abaixo, com detalhes em lápis-lazúli e em ouro.
Período Pré-Helênicos – Micênicos

De maneira geral, a jóias micênicas tinham a ver com utilização em ritos de natureza funerária e devido a isto, as joias não eram difundidas em larga escala. A utilização no dia a dia não era comum na sociedade micênica. Esta utilização mais específica leva a confecção da jóia micênica para uma peça mais clean, com menos detalhes e de formas mais simples. Sua confecção era mais associada a fauna local, tendo em sua maioria a representação de corujas, águias, seres híbridos com a esfinge, o grifo e em algumas ocasiões o ganso.

Algumas representações trazem figuras de animais que passam por processos de metamorfoses mais aparentes, ou faculdades de regeneração de partes do corpo (cigarra, polvo, abelha, sapo etc.) provavelmente associado à passagem para uma nova vida depois da morte. Embora tivesse mais representação da fauna, os micênicos também inseriam na sua joalheria folhas e flores. A representação da romã era associada à fertilidade. Devido à finalidade funerária, embora existam as representações de fauna e flora, as peças eram confeccionadas em série.
Período Helênico
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Archne tecendo. Life collection
O período Helênico se caracteriza por um grande salto em termos de estética para as artes, e com a joalheria não poderia ser diferente. Símbolo de status, a indumentária permeia como comunicação não-verbal por todas as classes e gêneros. SOUZA (2009) diz que “enfatizamos que, para fugir do silêncio euforizado pela virtude do não-falar, as mulheres atenienses desenvolveram outras formas de comunicação através, entre outros, da tecelagem, dos bordados nos tecidos e dos adereços (brincos, broches e espelhos). ”
Alexandre o Grande gradualmente adotou peças de indumentária de outras culturas, como o headband persa, o quiton (túnica branca drapeada) e o cinto persa. Antes de Alexandre as roupas possuíam mais detalhes decorativos e cores e não eram drapeadas.

O homem do campo e o escravo eram reconhecidos pela roupa curta e com pouca ou nenhuma manga e preso por uma fíbula. Os pescadores e população mais pobre tinham o torso nu (homens). Durante o período helenístico, as roupas eram confeccionadas por tecidos orgânicos vegetais (algodão, linho e fios de cannabis) e animais (cabelos, fio da seda, lã e couro). Para a cultura helenística, o anel era símbolo de autoridade e de respeito. Os escravos eram proibidos de usá-los. A maior parte das peças possuem a função de sinete, com o objetivo de selar documentos. A moldura em forma de folha era a forma mais comum para os anéis no período final do clássico.
O tipo de jóia mais voltada para a expressão do mitológico era o brinco. Feito em sua maioria em ouro, eles narravam histórias com detalhes que demonstram não apenas a expertise da técnica mas também a sensibilidade do artista.
A indumentária grega foi muito peculiar, uma característica marcante são os drapeados, que se adere ao corpo de maneira similar as esculturas da Grécia clássica. A população grega utilizava as túnicas no corte retangular, mas que variavam no formato de sobreposição no corpo de acordo com sexo e idade. O quíton era um modo de utilização da túnica muito difundido, preso sobre os ombros e em baixo dos braços sendo uma das laterais fechada e a outra aberta. Era preso nos ombros por um broche ou alfinetes (fíbulas) e na cintura amarrado por um cinto ou cordão. Uma peça feita de lã (período dórico) ou de linho (período jônico) tecido mais flexível que permitia maior variedade de dobras. Os jovens e os homens usavam o quíton até o joelho e as mulheres usavam o mesmo indo até o tornozelo (o quíton comprido também podia ser usado por homens e geralmente esse uso era feito em festividades). Em sua maioria as vestimentas eram unissex, porém algumas mulheres aderiam a um vestuário feminino próprio utilizando por exemplo o peplo, uma túnica presa por fíbulas e feita com dois retângulos de tecido.
Para segurar os seios utilizavam o strophim. No vestuário masculino era de costume a clamide, um manto curto preso ao pescoço que em geral vestia cavaleiros, soldados, atletas e viajantes e as vezes era a única vestimenta da indumentária masculina. As vestimentas eram unissex, eram usadas principalmente no período do inverno, posto que a nudez era algo visto com naturalidade.
O trabalho original apresentado na Disciplina História das Artes Visuais 1 com as observações da Prof. Aline Couri está no seguinte link: A Indumentária como linguagem do período pré-helênico ao clássico
Bibliografia:
RAUTMAN, A.E. – Reading the Body: Representations and Remains in the Archaeological Record. PENN, University of Pensilvania Press. 2000.
SOUZA, M.A.R.- As indumentárias das atenienses do Período Clássico constituindo discursos e ultrapassando fronteiras. ANPUH, XXV Simpósio Nacional de História, Fortaleza, 2009.
LAMBROPOULOS, S.D. Clothing Materials during the hellenistic period. In: PURPURAE VESES. II Symposium Internacional dobre textiles del mediterraneo em el mundo antiguo. (C. Alfaro, L, Karali, eds) pp. 79-82
CLINE, E. The Oxford Handbook of the Bronze Age Aegean. Oxford University Press. p. 450-454. 2012.
STEFANI, P.S. Moda e Comunicação: a indumentária como forma de expressão. Juiz de Fora, 2005.
Hemeroteca Digital:
www.amabeleza.com.br (acesso em 30 de junho de 2016)
http://agendawhite.com.br/2014/04/e/ (acesso em 30 de junho de 2016)
Fonte:http://www.britishmuseum.org/research/collection_online/collection_object_details.aspx?objectId=461980&partId=1 (acesso em 01 de julho de 2016)
http://www.cycladic.gr/frontoffice/portal.asp?cpage=RESOURCE&cresrc=1067&cnode=46&clang=1 (acesso em 01 de julho de 2016)
http://www.benaki.gr/index.asp?id=402010102&lang=en (acesso em 01 de julho de 2016)
http://www.getty.edu/art/collection/objects/11004/unknown-maker-ring-greek-3rd-century-bc/?artview=dor32948 (acesso em 01 de julho de 2016)
http://www.getty.edu/art/collection/objects/125641/unknown-maker-disk-earring-with-a-figure-of-eros-greek-220-100-bc/ (acesso em 01 de julho de 2016)