História do Conhecimento e a interface de todas as histórias

Quandos buscamos personalidades na história clássica, sempre vemos um espírito polímato, ou seja, que tem conhecimento sobre vários assuntos. Por exemplo, quando falamos de Tales de Mileto, estamos nos referindo a um filósofo que ao mesmo tempo era considerado astrônomo, matemático e engenheiro.

Em determinado momento da nossa história, nos períodos que rondam o Iluminismo, vimos surgir as ciências naturais como disciplina, e a partir de então não só temos as disciplinas – química, física, biologia, astronomia, entre outras – mas também as mais diversas especialidades – fisiologia, anatomia, morfologia, etc.

Mas estas especialidades não podem ser trabalhadas de forma estanque e individual. Como explicar pessoas que não aceitam a transfusão de sangue por motivos religiosos sem que a interface história da religião e história da ciência não seja explorada? E estamos falando de no mínimo dois campos do saber. Se inserir outras variáveis, como por exemplo que em alguns países, caso o doente esteja em risco de morte, o Estado suplanta a vontade do indivíduo e realiza a transfusão, entram em jogo questões politicas e sociais infinitas.

Percebe-se que todas as “caixinhas” do saber humano estão interligadas, como se fosse uma grande rede de comunicação das mais diversas possíveis. Olhar apenas para a história que interessa, é postular teorias contaminadas de erros

História do Conhecimento é algo sinérgico a partir da convergência entre vários campos do saber e suas informações existentes, em um processo multifacetado da história

E é sobre a História do Conhecimento que eu me debruço nos meus trabalhos. Nenhum fato se explica por si mesmo. Tudo é interligado, e o barato de trabalhar com a História do Conhecimento é descobrir estas interfaces fluidas e tentar entender fenômenos da sociedade que aparentemente parecem ser impossíveis de se explicar, como a teoria da terra plana em pleno século XXI e o movimento antivacina no meio de uma epidemia mortal.

Esse trabalho me fascina, me preenche, me faz sempre buscar mais. Mais histórias, mais conhecimentos, mais interconexões, na tentativa de entender um pouco mais esta nossa Humanidade.

Vamos juntos nesta jornada?

Gustave Doré e Cammile Flammarion

Para quem gosta de artes visuais, não tem como não se encantar com as ilustrações de Gustave Doré.

Este ilustrador, desenhista e pintor do séxulo XIX nasceu em Estrasburgo em 1832 e morreu em Paris em 1883. Extremamente bem sucedido, ilustrou os livros dos maiores escritores da história como Balzac, Cervantes, Milton, e tantos outros.

Mas seu conjunto de ilustrações mais famosa certamente é Divina Comédia, escrita pelo poeta italiandor Dante Alighieri (1265-1321), escrita no século XIV e dividida em três partes: Inferno, Purgatório e Paraíso. É um livro de poemas maravilhoso que narra a viagem do próprio Dante pelas três esferas da mitologia católica.

(ilustração: Caronte, o barqueiro do inferno, da divina comédia (Inferno) por Dante Alighieri (1265-1321) gravado por Stephane Pannemaker (1847-1930) c.1868)

No inferno e no purgatório, Dante tem a companhia do poeta grego Virgílio (70 a 19 a.C.), mas como Virgílio não era batizado, não pôde entrar no Paraíso dos venturosos. Nesta tarefa, a grande amada de Dante – Beatriz – o acompanhou até o final.

Mas este post não é sobre A Divina Comédia nem sobre Caronte…

Trabalhando como voluntária em uma biblioteca, na parte de obras raras, eu me vi frente a frente com uma ilustração de Gustave Doré até então desconhecida pelas pinacotecas e que eu não tinha encontrado nos arquivos da internet (se alguém já viu, pelo amor das musas, me fala!)

Encontrei esta ilustração de Doré em um livro de Cammile Flammarion, intitulado “Récits De L’infini-Lumen: Histoire D’une Comète. Dans L’infini”, no Brasil traduzido como Narrações do Infinito.

Esta imagem (muito mal fotografada pelo meu celular) é a capa deste livro. Esta edição é a 5a edição da Livraria Ernest Flammarion.

Cammile Flammarion foi um reconhecido astrônomo francês (1842-1925). Fundador da Société Astronomique de France, Cammile foi um grande expoente da Doutrina Espírita codificada por Allan Kardec. Além disso, Flammarion foi responsável pela popularização da astronomia para a sociedade civil.

Com certeza, ao trabalhar com este livro, minha emoção veio à tona, pois manusear um livro de mais de um século já é emocionante por sí só, ainda mais mas com uma ilustração inédita de Doré, que imortalizou tantos livros durante sua vida.

Confesso que nunca imaginaria tal feito, um livro unindo duas personalidades que me representam na minha história de vida. Cammile Flammarion representando minha porção historiadora da ciência e Gustave Doré representando minha porção historiadora da arte. Uma emoção única, com certeza!

Aparecendo novidades no meu cantinho da biblioteca de obras raras, com certeza venho correndo fazer uma resenha com vocês!